terça-feira, 17 de novembro de 2009

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Ministérios públicos Federal e Estadual recomendam à Universidade Federal de Ouro Preto que coíba atividades econômicas em moradias, onde estudantes cobram até R$ 500 no carnaval
Programação de carnaval 2010: ensaio de bateria com mais de 100 caixas de cerveja liberadas. No sábado, concentração do bloco com mais de 18 mil latas de cerveja e show a definir. No domingo, diversão na república com banda de pagode. Nos outros dias, festa o dia inteiro na casa e concentração do bloco. Na quarta-feira de cinzas, para quem aguentar, festa à tarde na república. Tudo isso a R$ 500 por pessoa (1º lote).
Não soaria estranho um anúncio como esse sendo feito por uma agência de turismo. Mas a propaganda, com caráter comercial e divulgada no site de relacionamentos Orkut, está sendo feita por repúblicas federais de Ouro Preto, na Região Central de Minas, a 98 quilômetros de Belo Horizonte, e representa a ponta de um iceberg de problemas e conflitos que a cidade histórica enfrenta.
Chegando a vender até 5 mil abadás por carnaval, com preços que variam entre R$ 250 a R$ 500, os universitários que moram nas repúblicas – pertencentes à União – estão na polêmica que divide uso de bem público e sua manutenção. Em 28 de outubro, o Ministério Público Estadual (MPE) e o Ministério Público Federal (MPF) encaminharam recomendação conjunta ao reitor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), João Luiz Martins, para que sejam coibidas atividades econômicas no interior dos imóveis públicos que abrigam as repúblicas estudantis.
“Queremos a transparência na gestão dessas moradias, que são um bem público e, como tal, não podem virar um espaço para se ganhar dinheiro”, diz o promotor de Justiça Ronaldo Crawford, que alerta: “Não há controle algum sobre o uso desses espaços. O fato de os estudantes serem os responsáveis pela administração não significa que eles tenham poder de proprietários.” Há 60 repúblicas federais em Ouro Preto e 300 particulares, sem qualquer vínculo com a universidade.
De acordo com ele, as repúblicas em Ouro Preto estão se tornando empresas, com lucros e clientes cada vez maiores. “Tem moradia estudantil federal que chega a receber por carnaval, no mínimo, R$ 500 mil”, diz, criticando a falta de controle da reitoria da Ufop. “São os universitários que ditam as regras. Eles que escolhem, por exemplo, quem vai ou não morar ali. O que eles fazem com o dinheiro que recebem alugando quartos ou vendendo abadás de carnaval para uma festa nos imóveis ?”, questiona.
Mas as festas, nas quais Ouro Preto chega a receber cerca de 40 mil pessoas, como no carnaval do ano passado, não são o principal problema na visão do estudante de farmácia Ricardo Bouez, de 32 anos. Morador de Ouro Preto há 13 anos, Ricardo destaca que a universidade sempre foi omissa diante de muitos conflitos existentes. “Moro numa república particular e tenho observado que as coisas estão se invertendo. Para eu morar aqui, desembolso R$ 250 mensais porque pago aluguel. Mas numa república federal esse valor chega a R$ 450”, compara, questionando que por se tratar de um bem público, que teve como objetivo dar moradia a alunos sem condições financeiras, a realidade deveria ser outra. “Como um estudante carente vai morar numa república da União se os estudantes que lá vivem cobram alto? Nesses lugares, geralmente casas muito grandes, só há sete moradores, porque os outros quartos são para a boate, outro para hóspedes etc. Com o lucro das festas, eles se unem e vão todos para a praia. Que tradição é essa?”, acrescenta Bouez.
Evando Aparecido Gaskue, de 25, estudante de filosofia da Ufop, morou apenas um mês numa república da Ufop. “Fui constrangido, humilhado. Não tinha direito de ir e vir, até vinagre com álcool tive que beber para não ser expulso”, lembra, contando que os universitários chegavam a lucrar até R$ 12 mil com o carnaval. “O grande problema que enfrentamos é que por trás dessa omissão existe muita influência. O trote ainda é tradição aqui”, lamenta. “As repúblicas são patrimônios públicos e deveriam ter critérios objetivos de uso, mas quem manda ali são os estudantes, que estabelecem as próprias regras”, diz o estudante de direito Luiz Felipe Perdigão.
Na opinião de Márcio Abdo de Freitas, presidente do Ouro Preto e Circuito do Ouro – Convention e Visitors Bureau, o problema é uma discussão que envolve toda a comunidade. “Estamos vivendo uma exploração comercial em um espaço que não foi feito para isso. O carnaval em Ouro Preto está perdendo a essência de atrair turistas que vêm para uma folia mais tranquila. Hoje em dia, até mesmo os monumentos históricos têm que estar tampados quando estamos no período carnavalesco. E a falta de água e o trânsito caótico são consequências disso”, avalia, apontando que a situação deve ser resolvida pela universidade.
PROTEçãO AO PATRIMôNIO
Procuradores do Ministério Público Federal reúnem-se, na próxima quinta feira, com representantes das prefeituras das cidades históricas de Minas e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para discutir a fixação de normas para eventos públicos em áreas tombadas pelo patrimônio. O objetivo é estabelecer procedimentos para a realização de promoções com a preservação do acervo histórico e garantia da segurança da população. Entre as preocupações estão eventos realizados sobretudo em Tiradentes, no Campo das Vertentes, que recebe anualmente um festival gastronômico e uma mostra de cinema, além de exposições, feiras e festivais de repercussão internacional. “O patrimônio cultural ficava exposto a todo tipo de desgaste, poluição e ruídos sem que as prefeituras e os órgãos responsáveis pela proteção cultural tomassem providências específicas para resguardo dos bens”, afirma o procurador da República Antônio Arthur Barros Mendes.

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